Cinco maneiras de falhar miseravelmente ao estudar a LGPD

Estudar: cada um tem uma maneira e uma estratégia muito próprias. Longe de mim, portanto, querer desenhar um mapa para o sucesso. Isso não existe. As pessoas têm backgrounds diversos, objetivos distintos e disponibilidade variada. Então é óbvio que não faz sentido uma solução mágica que entregue algo mais ou menos parecido com isso: "olha, se você fizer X, Y e Z, no tempo tal você conhecerá tudo sobre a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (nossa querida LGPD - Lei 13.709/18) e, portanto, terá muito sucesso em sua carreira".

Infelizmente esse tipo de abordagem é comum. Lembra muito aquela ideia de cursinhos enlatados e mnemônicos/canções bobas para decorar fórmulas. Tenho visto esse tipo de propagação em todo lugar, o que obviamente inclui o LinkedIn, que se tornou o santuário das soluções mágicas e o nascedouro de iluminados. Centenas (para dizer o mínimo) de profissionais já sabem tudo sobre a LGPD e sobre o GDPR (no Podcast em que entrevistei o brilhante Marcel Leonardi, ele comentou de uma pessoa que se dizia especialista em GDPR há pelo menos dez anos).

Como estudiosa do tema de privacidade desde 2001, não acredito nem um pouco em recursos instantâneos para consolidar conhecimento. Trata-se de um processo contínuo, razão pela qual costumo dizer que quem fez essa escolha vai estudar (e muito!) por todos os dias da sua vida.

E o que fazer, você estaria me perguntando? Bem, cada um sabe o que funciona para si para atingir um determinado objetivo. O que eu posso fazer por você é apenas apontar cinco maneiras de falhar miseravelmente no estudo da proteção de dados como um todo. São cinco chaves para o fracasso. Acredite! Se você segui-las de forma fiel e dedicada, rumará para o abismo rapidamente.

1) Ignore o GDPR

Esse é o principal e mais comum erro. Muitas pessoas acham que a LGPD brotou do nada, ou, na melhor das hipóteses, que foi geração espontânea que nasceu do cérebro do legislador brasileiro. Não, queridos. A Lei é fortemente inspirada no Regulamento EU 679/16. Pode-se assim dizer, portanto, que o edifício foi construído com base em pilares muito similares. Há diferenças, é claro. Mas, por favor, não tente interpretar a LGPD à sua maneira e com base na sua percepção pessoal. Isso é um ponto cego gravíssimo. Há uma lógica por detrás de cada um dos conceitos que está na lei e, o mais importante, há uma história de décadas.

2) Priorize a segurança da informação em detrimento da compreensão legal

Não é incomum que profissionais da área da segurança da informação detestem a lei. Muitos deles acham que a necessidade de proteção sempre existiu e que agora parece que o mundo deseja reinventar a roda. Desculpe, você está errado. Para muito além dos aspectos da segurança da informação, é necessário, sim, conhecer o específico significado dos termos da lei e compreender de forma profunda seus fundamentos, princípios, bases legais, papel dos stakeholders, regras de transferências e um sem-número de outras normas. Estamos falando de uma lei, certo? Ela é, portanto, muito mais do que um standard ou um framework.

3) Concentre-se apenas nos aspectos legais

Esse é um erro básico e comum no universo jurídico. Via de regra, advogados são profissionais teóricos. Sendo assim, muitos deles têm mesmo predileção por teorizar a lei, analisá-la exclusivamente sob aspectos formais e até mesmo abordá-la sob as vertentes filosóficas, sociológicas e ideológicas. Tudo bem. Mas saiba que isso não atende a realidade. Se você quer de fato compreender a legislação e quiçá trabalhar com isso, sugiro que se dedique a minimamente estudar segurança da informação e gestão. Além disso, queridos, vocês precisam saber como as empresas operam na prática. A vida lá fora é bem diferente e nem tudo está nos livros.

4) Pesquise soluções mágicas para vender projetos de implementação

Conhecer ferramentas faz parte do processo de aprendizagem. No entanto, eu tenho uma boa e uma má notícia. Quer começar por qual? Vamos à boa. Existem ferramentas excelentes no mercado, algumas delas disponibilizadas até mesmo de forma modular. Isso ajuda demais. A má notícia? Nem todas elas servem para tudo e para todos. E ficará muito chato para você se vier a vender uma ferramenta a peso de ouro a um cliente, para, logo depois, ele descobrir que poderia ter feito de uma outra forma, com recursos já existentes na organização. Não passe por isso. É feio. Já ouvi relatos nominais dizendo que o profissional tal causou prejuízo financeiro à empresa. Não é melhor concentrar seus estudos na multiplicidade de opções potencialmente disponíveis a um específico projeto?

5) Faça um curso e considere-se especialista

Tudo bem você colocar sua titulação e seus skills no LinkedIn. Isso vai de fato te ajudar. Mas faça uma reflexão sincera. Sabe aquela coisa de se olhar no espelho e de falar com você mesmo? Pois então. Isso é muito importante. Em meu caminho, prefiro sofrer da "síndrome do impostor" a achar que sei o bastante. Quem me acompanha por aqui sabe que sou assídua frequentadora de cursos (sim, continuo tendo a humildade de pagar para aprender onde vejo que algo possa ser acrescentado). E quanto mais eu estudo, mais tenho a certeza de quantas pessoas são efetivamente muito mais preparadas do que eu. Um girozinho (ainda que virtual) pelo mercado europeu prova que seu conhecimento, se comparado ao dos grandes experts, é próximo do nada. Zero mesmo. Isso não é ofensivo. É a realidade.

Queridos, escolhi o caminho exclusivo da docência após 25 anos de carreira na Magistratura. Eu amo aprender e ensinar. Tudo o que eu estou dizendo para vocês é com amor no coração, para que vocês não cometam erros que podem prejudicar o seu trajeto. Isso me deixaria muito chateada.

O que eu gostaria mesmo é que o Brasil fosse uma referência em matéria de proteção de dados no mundo. Essa é uma grande oportunidade para todos nós, brasileiros apaixonados que somos. Por isso insisto no ponto de que devemos nos empenhar para sempre elevar o padrão. Não há atalhos e nem trabalho fácil. Muito menos resultados milionários imediatos. O esforço é constante. Não tenham pressa. E estudem, estudem, estudem para que possam entregar um trabalho decente.

Desejo a todos vocês muito sucesso!

(post originariamente publicado no LinkedIn em 11/10/19. Acesse aqui.)


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Blog Post escrito por:
Viviane Maldonado